Às vezes gostava de ser um gravador. Eu explico melhor. Gostava de ser um
gravador humano que se põe em funcionamento automaticamente quando a conversa
que estamos a ter ou quando aquilo que estamos a ouvir é mesmo muito
interessante, engraçado ou importante. Também dava jeito se este gravador
pudesse gravar as coisas que vou pensando e que são importantes. Bom, eu
raramente tenho pensamentos importantes/profundos, sou demasiado matarruana
para ter pensamentos profundos, há que dizê-lo com frontalidade. Mas mesmo não
tendo pensamentos profundos, sempre vou tendo conversas interessantes e
engraçadas e volta e meia chego a ter alguns pensamentos importantes (não
profundos mas importantes). E é nessas alturas que eu gostava de ser um
gravador, porque me gravava para ouvir/recordar mais tarde. Mas não só a mim, também
às outras pessoas! Por exemplo, ontem, e isto acontece várias vezes, estive à
conversa com a minha filha mais nova. A minha filha mais nova tem conversas
interessantíssimas, tem saídas muito engraçadas, tem ideias maravilhosas, tem uma
prosa que é digna de se ouvir e registar para a posteridade. Mas eu, como já
não caminho para mais nova e desconfio que a minha memória ainda é mais velha
que eu, passado algum tempo e se não registar em lado nenhum, esqueço-me do que
estive a conversar e daquilo que ela me disse e que achei tanta piada. O
tramado é que quando tenho estas conversas ou estou a fazer o jantar ou estou a
dar-lhes banho ou estou a fazer outra qualquer tarefa que também necessita da minha
atenção e portanto não dá para parar tudo e ir buscar um pedaço de papel para
escrever a coisa. Por isso é que eu gostava de ser um gravador, percebem? Para
não perder estas conversas. Assim como guardamos o acervo fotográfico nos álbuns,
assim também guardava o acervo de conversas, pensamentos, ideias que fui tendo
ao longo dos anos e depois ouvia quando queria. Era um espetáculo!
Outra coisa
que também me acontece muito e que me faz desejar ardentemente ter um gravador incorporado,
sei lá, numa axila, ou assim, é o facto de, por vezes me ocorrerem ideias
espectaculares e eu querer mesmo muito pô-las em prática mas como não as aponto,
as ideias vão para o galheiro e depois vou ter que as ter novamente e não é
garantido que isso aconteça.
Isto tudo para vos dizer: a velhice chegou forte e feio e para além de
estar a perder a memória, também me dá para escrever sobre temas que não
lembram a ninguém, como a ideia absurda de ser um gravador humano. Mas o que é
que querem? Tinha de escrever sobre isto porque senão ia esquecer-me e como não
tenho um gravador incorporado na axila ou na virilha para gravar este
pensamento, aproveitei este tempinho sem nada para fazer para partilhar
convosco este meu desejo. No próximo texto conto-vos tudo sobre o
terceiro mamilo felpudo que me está a nascer na anca.
Stay tunned!
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