março 23, 2011

Da vida, da morte, da culpa...

Segunda-Feira de madrugada a minha avó Helena despediu-se deste mundo. Sozinha, silenciosa e para sempre…
Ao lembrar-me o que eu já gostei desta avó e do medo que sentia, quando era miúda, quando pensava que ela uma dia podia morrer, parece-me hoje tão, mas tão distante…
Há alguns anos que me afastei da minha avó… cansei-me de a adorar e de receber pouco, de descobrir coisas sobre ela que me fizeram mal, de a ouvir dizer mal da minha mãe (a sua própria filha), de a ver idolatrar o meu tio (seu filho) e desprezar por completo a minha mãe. É irónico… muitas vezes me queixo da divisão pouco igual que a minha mãe fazia dos afectos entre as suas filhas e esqueço-me constantemente que ela sofreu isso na pele a vida inteira e que, portanto, não teve o discernimento suficiente para não o fazer com as suas próprias filhas.
Era tudo mau? Não, não era tudo mau. A minha avó era bondosa… à sua maneira, mas era bondosa. Durante um período importante das nossas vidas, tomou conta de nós, deu-nos aquilo que a sua condição lhe permitia e eu acredito que, à maneira dela, gostava de nós.
Era uma avó afectuosa? Lembro-me de alguns episódios em que me senti acarinhada, outros tantos me lembro em que me senti completamente ignorada e, acima de tudo, preterida.
Nunca se lembrou do meu aniversário, se calhar lembrava-se, mas achava que não era importante festejar ou sequer ligar para dar os parabéns à neta.
No dia do seu falecimento e depois de um longo período sem a ver, apesar de a saber doente, o sentimento que me inunda o coração é o de arrependimento, de culpa e de tristeza. Arrependimento por permitir que, por ela não me ligar, não querer saber se estou viva, morta, bem ou mal, eu ter feito a mesma coisa, culpa, por ser uma mulher de quase 40 anos de uma geração completamente diferente da dela e portanto, com obrigação de ver as coisas com muito mais racionalidade, não ter agido como era a minha obrigação, tristeza, por ser a pessoa que sou e, acima de tudo, porque agora o tempo não volta para trás e eu não posso ir visitá-la e finalmente dizer-lhe que, apesar de tudo, eu já gostei TANTO dela e… ainda gosto, avó… ainda gosto.
Hoje percebo que deixamos de fazer e dizer coisas por orgulho, por preguiça e porque achamos que somos imortais e os outros também cá andarão para sempre e portanto, estamos sempre a tempo de “emendar a mão”… mas não estamos, não estamos…
São dias de grande tristeza, estes que vivo, sinto que deixei uma parte importante de mim naquele sítio onde fomos deixar a minha avó para ser cremada. Espero que ela me perdoe, espero que Deus me perdoe e espero também conseguir perdoar-me… um dia…